23h00, o GRANDE PORTO inicia o giro com Travassos. A noite de nevoeiro grave e frio sério acompanham Travassos, antigo marceneiro reformado. É altura de se apresentar na Esquadra do Infante. “Meu comissário dá licença?”, interpela.
O ritual espoleta uma viagem a um tempo esquecido e as ruas transformam-se num museu em que Travassos é o guia. Na cabeça leva o velho barrete de guarda. Os polícias tem-lhe carinho e o “49” segue para o giro da noite. Calca as ruas do Infante até à Batalha e lá bate o quarteirão vezes sem conta até à aurora. “O turno acaba às 5h00”, explica. Travassos exerce uma profissão de ninguém no Porto. “Somos regulamentados pela PSP e pela Câmara, mas não temos ordenado. Pedimos contribuições, que são mais esmolas”, refere.
O ancião vigilante tem razão. A maioria dos comerciantes paga entre os 2.50 e os 4 euros, por mês. “E temos de os ir cobrar”, alerta o homem que agora já só tem 40 clientes a pagar. Em média, ganha 200 euros para colmatar a fraca reforma. “Dá para medicamentos”, diz. Para cobrar passa um recibo que de nada vale. E assim o ofício vai se mantendo. “Ninguém quer vir para aqui. Se existisse um salário fixo talvez”, queixa-se.
Disparou arma uma vez
Travassos já não usa arma, mas ainda se recorda da última vez que a disparou há vários anos. Quando mostrava a pistola a uma chefe da PSP, teve “um azar e a bala saiu ao lado, felizmente”, explica. Os guardas que querem continuar armados têm de frequentar um curso e usar uma arma de defesa pessoal. “A PSP dava-me arma que levantava na esquadra, mas há um ano deixaram de dar”, diz. A alteração foi provocada pela nova lei das armas.
Travassos conhece todas as pessoas que habitam a noite da zona que patrulha. “Os guardas nocturnos são necessários”, diz José Neves, antigo dono da Estação de Camionetas da Batalha. Os motoristas de autocarro acenam todos a Travassos que garante que não irá continuar na noite por muito mais tempo