Estando para breve a Formação de Guarda-Noturno, que estará a ser ultimada pelo MAI, sendo que aguardamos resposta às nossas sugestões, publicamos um Manual Prático do Guarda-Noturno, de forma a dar melhor a conhecer aos profissionais, mas também à população em geral, o procedimento do Guarda-Noturno perante crimes por si presenciados, a sua tipificação, métodos de procedimento e seu equipamento, clarificando assim as suas funções e a importância da profissão na segurança comunitária.
Enquadramento do guarda‑noturno
A atividade de guarda‑noturno é
de interesse público, subsidiária e complementar das forças de segurança,
exercida em arruamentos do domínio público, durante a noite, com licenciamento
municipal e âmbito territorial definido pela câmara municipal.
O guarda‑noturno atua de forma
preventiva, colabora com as forças de segurança e proteção civil, informa no
mais curto espaço de tempo o que tenha relevância policial, regendo‑se pelas
normas gerais de socorro, legítima defesa, detenção e uso/porte de armas.
Tipos de crime
- Crime público: o procedimento inicia‑se
oficiosamente com a notícia do crime, independentemente de queixa do
ofendido, e o processo corre mesmo contra a sua vontade.
- Crime semi‑público: exige queixa do titular do
direito de queixa para que o Ministério Público atue, sendo admissível a
desistência da queixa.
- Crime particular: depende de constituição como
assistente e de acusação particular oportunamente deduzida pelo ofendido.
- Dica de leitura legal: se o tipo legal nada disser,
é público; se disser “depende de queixa”, é semi‑público; se exigir
“acusação particular”, é particular.
Quadro comparativo
Tipo |
Início do
procedimento |
Papel do
ofendido |
Regra prática |
Detenção por
particular em flagrante |
Público |
Inicia oficiosamente pelo
Ministério Público ao tomar notícia. |
Queixa não é necessária. |
Se o preceito nada referir, é
público. |
Admissível se o crime for
punível com prisão, com entrega imediata à polícia. |
Semi‑público |
Exige queixa do titular para se
iniciar. |
Pode desistir da queixa. |
Se disser “depende de queixa”,
é semi‑público. |
Apenas se mantém se a queixa
for exercida em ato seguido à detenção. |
Particular |
Depende de constituição como
assistente e acusação particular. |
Ofendido deduz acusação
particular. |
Se exigir “acusação
particular”, é particular. |
Não há detenção; apenas
identificação do infrator. |
Flagrante delito e detenção
por particulares
Há flagrante delito quando o
crime está a ocorrer ou acabou de se cometer, incluindo perseguição logo após o
crime, ou encontrado com objetos ou sinais que mostrem claramente que acabou de
o cometer ou nele participar.
Em flagrante por crime punível
com prisão, qualquer pessoa pode deter se a polícia não está presente nem pode
ser chamada em tempo útil, devendo entregar imediatamente o detido à autoridade
policial ou judiciária.
Se o crime depender de queixa, a
detenção só se mantém se o titular exercer a queixa em ato seguido, e se
depender de acusação particular não há detenção, apenas identificação do
infrator.
Legítima defesa e limites
"Constitui legítima defesa o
facto praticado como meio necessário para repelir a agressão atual e ilícita de
interesses juridicamente protegidos do agente ou de terceiro."
Se ocorrer excesso dos meios
empregados, o facto é ilícito, mas a pena pode ser especialmente atenuada, não
havendo punição se o excesso resultar de perturbação, medo ou susto não
censuráveis.
A jurisprudência explica que o
ponto de distinção entre legítima defesa e excesso está na
proporcionalidade/adequação dos meios usados face à agressão atual e ilícita,
cabendo afastar a ilicitude quando se atue como meio necessário para repeli‑la.
Regras práticas para o guarda‑noturno
- Zona e função: atuar dentro da área de atuação
definida e com objetivos preventivos, mantendo vigilância e proteção de pessoa
e bens, colaborando com as forças de segurança e proteção civil.
- Observação e alerta: sempre que haja notícia de
facto relevante, informar as forças e serviços de segurança no mais curto
espaço de tempo e receber informação relevante sobre segurança na área.
- Crime público presenciado: priorizar segurança de
terceiros, contactar de imediato as forças de segurança, e se necessário,
deter em flagrante, entregando imediatamente o detido à polícia.
- Crime semi‑público presenciado: contactar de
imediato a polícia, e se necessário, deter em flagrante, esclarecendo a
vítima sobre a necessidade de queixa, sabendo que a detenção só se mantém
se a queixa for apresentada em ato seguido.
- Crime particular presenciado: contactar a polícia, aguardar
no local com o alegado infrator e a vítima, e não deter, por a lei apenas
permitir a identificação.
- Uso da força: apenas o mínimo necessário para
cessar agressão atual e ilícita, privilegiando dissuasão, distanciamento e
pedido de apoio, sob pena de excesso de legítima defesa.
- Armas e meios: sujeito ao regime geral de uso e
porte de armas, podendo recorrer a arma de fogo, bastão, armas da classe E,
algemas e rádio apto a comunicar permanentemente com as forças e serviços
de segurança, bem como outro material legalmente distribuído pela força de
segurança territorialmente competente e cujo uso esteja superiormente
autorizado.
- Deveres operacionais: apresentar‑se no início e
termo do serviço na entidade policial competente, permanecer contactável e
na área, usar uniforme e identificação, e prestar auxílio solicitado pelas
forças de segurança e proteção civil, prestar auxílio a todas as pessoas
que se lhe dirijam ou careçam de auxílio.
Proteção de pessoas e bens em
proteção civil
A coordenação municipal em
proteção civil faz‑se através da Comissão Municipal de Proteção Civil, que
articula entidades essenciais às operações de proteção, socorro, emergência e
assistência, incluindo forças de segurança.
A lei do guarda‑noturno impõe
colaboração com forças e serviços de segurança e de proteção civil, podendo
estes solicitar apoio, que deve ser prestado dentro do âmbito das suas funções
Checklist rápido de atuação
noturna
- Perigo imediato a pessoas: garantir afastamento e
chamar de imediato as forças de segurança/proteção civil, intervindo
fisicamente só como meio necessário para cessar agressão atual e ilícita.
- Flagrante em crime público: deter se a polícia não
puder ser chamada em tempo útil e entregar de imediato à autoridade.
- Flagrante delito e crime semipúblico: incentivar
apresentação de queixa e manter a detenção até à chegada das forças de
segurança.
- Flagrante delito em crime particular: não deter, aguardar
junto do suspeito até à chegada das autoridades.
- Após uso de arma/meio: reportar à força de
segurança nos termos legais.
Nota legal útil para consulta:
conceitos e classificações de procedimento criminal no portal do Ministério
Público, definição legal de legítima defesa nos artigos 31.º a 33.º do Código
Penal, regras de flagrante delito e detenção de particulares no Código de
Processo Penal, e regime do guarda‑noturno na Lei n.º 105/2015.
Continuamos a trabalhar na defesa dos nossos associados, em especial, e da profissão em geral, defendendo sempre a classe como um todo e os direitos individuais de cada profissional.